RAFAEL BALSEMÃO
Revista da Folha
| Roberto Assunção/Folha Imagem |
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| Villa Europa Hotel & Spa do Vinho, onde os alunos do curso ficarão hospedados |
O prato principal do jantar era um vinho: um Romanée-Conti safra 1985, avaliado em R$ 28 mil. Para acompanhá-lo, magret de canard com um molho reduzido de laranja. Tempo de preparo: oito horas. Mesa posta e prato pronto. O ano era 2005, e o empresário paulistano David Macedo Appel, 44, estava realizando um sonho.
Que duraria pouco. O vinho estava estragado, com a "doença da rolha", que deixa a bebida com odor e gosto de mofo. À mesa, David, a mulher e o casal que os acompanhava choraram. Para quem não é amante de vinho, parece exagero.
Já para um enófilo, o drama é compreensível. São pessoas com esse perfil que começam no próximo final de semana um curso inédito no país, o Winemaker, na vinícola Miolo, em Bento Gonçalves (RS).
Cinco paulistas -David é um deles -estarão entre os 20 participantes que terão aulas teóricas e práticas para produzir um vinho exclusivo. O curso engloba acompanhar a maturação da uva, a colheita e a elaboração da bebida. "Algumas garrafas vão ficar para a história e de forma alguma serão abertas", afirma o empresário.
Serão três encontros na sede da Miolo, no vale dos Vinhedos, de onde sai a maior parte dos bons vinhos do Brasil. Cada aluno vai definir o nome de sua garrafa e criar um rótulo para personalizar a bebida, já que o produto final é o mesmo para todos. "Será um vinho para ser tomado apenas em ocasiões especiais. Com a bebida em mãos, ele vai se sentir o dono do mundo", empolga-se Antonio Miolo, diretor da vinícola.
As 60 garrafas do produto exclusivo a que cada aluno do curso terá direito no final vão se somar às cerca de 3.000 (300 rótulos) da adega climatizada de 45 m2 da casa de David, em um condomínio na Granja Viana. Entre elas, um Bergerac de 1996, à venda nos supermercados por R$ 20. Apesar do preço, é um dos mais importantes na coleção do empresário. O ano era o mesmo da safra da bebida, saboreada com a mulher no frio do inverno na praia de Peruíbe. "Foi ele que me levou para o mundo do vinho. Nunca mais tomei outra bebida." David destaca ainda como raridade em sua adega, cujo valor total investido não revela, um Chateaux Petrus de 1992, preço estimado em US$ 15 mil (cerca de R$ 23.500).
Receita da felicidade
Com 300 garrafas (200 rótulos) em sua casa, no município de Salto (101 km de SP), o advogado Cláudio Amaury Barrios, 48, é outro paulista que fará o curso. O objetivo dele, que já foi 12 vezes a Bento Gonçalves, é criar um rótulo em homenagem à mãe, que completa no ano que vem 75 anos. Será o Dona Lázara. Já contratou inclusive uma agência de design para produzir o rótulo. A bebida, diz Cláudio, tem todo um ritual especial de apreciação que está diretamente ligado às emoções. "Vinho, amor e canção são as essências da felicidade", acredita ele.
O advogado destaca o "ritual socializador" da bebida. "O vinho é um agente de integração." E confraternizar está na pauta dos finais de semana no sul do país.
Além de todo o clima do vale dos Vinhedos, os participantes do curso ficarão hospedados no hotel Villa Europa, cujas diárias variam de R$ 450 a R$ 1.500. Lá, fazem parte do pacote dos amantes da vinicultura almoços e jantares harmonizados, assim como tratamentos no Spa do Vinho, à base de subprodutos da vinificação (tudo o que sobra da uva quando se faz a bebida).
Os quartos do hotel remetem às casas dos colonos da serra gaúcha. "Os móveis são inspirados na memória de uma Europa rica, que ficou na cabeça do imigrante", explica Deborah Dadalt, diretora do hotel.
Entre os tratamentos do spa, um dos destaques é o "bain barrique" (banho de barril, em francês), feito em uma banheira de hidromassagem revestida de grápia, madeira utilizada no passado para fazer tonéis de vinho. O mimo sai por R$ 100 e é uma espécie de "entrada" para os pratos principais: envelopamentos, esfoliações e massagens.
A hospedagem e as técnicas de relaxamento, além das aulas e das garrafas ao final, estão inclusas no pacote do curso, no valor de R$ 6.000. O engenheiro Samoel Vieira de Souza, 64, e sua mulher, a paisagista Mércia, vão experimentar todo esse luxo na primeira viagem à região. "O conhecimento do vale dos Vinhedos vai se dar de uma forma muito gostosa", afirma Samoel.
Os dois ainda não tiveram tempo para pensar no rótulo que irão produzir, mas uma reunião entre amigos com o vinho personalizado já está nos planos do casal. "O resto vai ser decidido lá", diz ela.
A comemoração vai acontecer na adega dos Souza, na casa onde moram, em Valinhos, distante 85 Km da capital. Com 650 garrafas (200 rótulos), ela foi inspirada em uma casa de vinhos de Nuremberg que visitaram na Alemanha. O marco mais antigo da coleção é uma garrafa vazia do espumante nacional Peterlongo de 1962, aberta em 1987 para comemorar os 18 anos de uma das filhas do casal.
A paixão pelo vinho só foi aumentando ao longo dos 47 anos de vida em conjunto de Samoel e Mércia. A bebida esteve presente em todas as datas importantes. "Para o casamento dos nossos filhos, os vinhos foram escolhidos a dedo, com muito carinho", conta a paisagista.
Acostumado a apreciar vinhos de qualidade durante viagens a países como França, Portugal, Itália e Chile, o casal vai encarar o curso como uma oportunidade de colocar a mão na massa. Já no próximo fim de semana, eles estarão com a equipe da Miolo e os outros alunos fazendo a poda seca, o primeiro corte na videira em busca da melhor uva para o vinho personalizado. "Vai ser uma oportunidade para trocar conhecimento e perguntar muito", diz Mércia.
Estão previstos ainda mais dois encontros em Bento Gonçalves, em novembro próximo e em março do ano que vem. Todo o processo poderá ser acompanhado pela internet, até a entrega das 60 garrafas que cada um irá receber em fevereiro de 2010. Uma espera que, sem dúvida, vai dar um gosto especial ao vinho.
fonte: http://www1.folha.uol.com.br
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